quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Os anjos abrem os portões


Morreu. Esta é a sua empreitada por entre terras longíquas, por entre lugares assombrosos e fantásticos.

Por razões das quais eu não tomo conhecimento suicidou-lhe o corpo e a alma. Seus pertences carnais e espirituais foram tirados por si mesmo. Talvez por uma tristeza infinita, uma angústia de viver, um abandono, lágrimas que secaram sozinhas... não importa.

No momento em que fechou os olhos para essa vida, logo abriam-se outros. Sentiu o baque sobre as pernas, não sentiu dor. Abriu os olhos e se encontrou então em selva tenebrosa. Tudo era pedra, madeira morta, ferro, aço e lama. Nada era vivo. Nada que ali pisasse ou chorasse era vida. Almas suplicantes em vida agora suplicantes em morte.

Sentiu uma angústia rasgando-lhe o coração. Vacilou no passo e tombou na terra obscura. Viu próximo dali almas que rastejavam, homens e mulheres, jovens e velhos. Todos que não aprenderam a viver. Todos que infligiram ódio e medo. Ali eles repousavam.

Era o inferno. Não havia grilhões os prendendo a terra, nem fogo infinito queimando as pedras, nem chicote, nem um senhor do escuro. Havia apenas antivida. Ali, no inferno, todos os seus medos em vida sucumbiam seu coração. Todas as suas angústia corrompiam a sua alma. Um sofrimento inimaginável. Um sofrimento na alma, na mente, no coração. Era tempo para refletir.

Depois de um longo período de lamúria e dor, desciam dos céus anjos celestiais que irrompiam pelas nuvens negras. Desciam cheios de pesar por ver ali pessoas sofrendo. Quando tocavam o solo erradiavam luz e vida. As pessoas se aproximavam, mas nem todos poderiam ir ainda. Buscavam então a alma regenerada e tomavam-lhe nos braços. Uma farfalhada de suas asas gigantescas lhe tiravam do chão e lá iam eles com a alma renascida. Levavam-na para os céus, entre nuvens metálicas.

A alma então via, através das nuvens, o sol irradiando sua luz de bronze. Clarins soavam pelos céus junto com o farfalhar das imensas asas angelicais. Era a sua hora de descansar.

Era a sua hora.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

O coração selvagem


Águias de bronze cruzam os céus metálicos. Fogem de tormentas longíquas que vêm apoderando-se do infinito azul. Os raios cortam a escuridão em relâmpagos fotográficos. Os trovões tremem o solo, como a poderosa voz de Deus. Então, gotas descem das nuvens, rasgando os céus como ínfimos cometas gelados. Caem livres, como bombas, explodindo sobre as criaturas que olham a tudo com faces assombradas.

Nesse momento a Terra respira aliviada. Sem fogo, sem fumaça, sem sangue. A chuva. Ela cai para limpar toda a sujeira. Caindo...caindo... um presente dos céus. Rebomboam no ar os tambores, ressoam os clarins da vida. Notas musicais navegam pelo escuro, tão natural como a própria natureza.

Nada é mais belo quanto a chuva.

É uma mensagem particular de Deus para seus mais belos súditos, aqueles seres viventes que pisam no solo e ali vivem. Não sangram a terra. Sabem todos que a grama verdejante é seu chão, o céu o seu abrigo e as árvores suas moradias. Esses são os anjos que desceram dos céus.

Não há poder, não há propriedade, não há código. Tudo é tão natural como a carne e o sangue. Viver e se deixar viver. Essa é a lei da Natureza.

As águias cruzam os céus, os leões caçam suas presas, os lobos uivam pela noite, serpentes e macacos convivem nas árvores e nada os impede de viver. O coração selvagem pulsa forte como a batida de um galope, quente, indomável e hostil. Um coração que retumba com vigor dentro da cavidade fria da Natureza. Tento segurá-lo com minhas mãos, que ávidas, buscam uma saída para todo o desespero e aprisionamento.

Ele pulsa num reboar profundo, de dentro da escuridão. Entre as árvores e as montanhas, como quem chama almas suplicantes de aventura.

Entregue-se ao coração selvagem, pois a vida clama por um pouco mais de liberdade.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Sonhos de primavera


As coisas vêm e me atordoam como socos interruptíveis. Nunca param.


Quando eu caio, me levanto. Quando torno a cair, por ali fico. Daí me levanto novamente e fagulhas transpassam meu corpo como cacos de vidro quebrados em mil fragmentos.


Crio um escudo para isso e para aquilo, mesmo assim coisas novas vêm. Vêm de todos os lugares, tomando conta do espaço, da visão, dos sentindos. Só me resta me entregar aos meus ínfimos costusmes e gostos. Me entrego aos tragos de café, as leituras incassáveis, as esperas pelas tardes de chuva. Só me resta isso...

Fico caído na chuva, no solo rachado sob meus pés. Não quero levantar, quero ficar ali sentindo as gotas de água me atingirem, destruindo meu corpo como línguas de fogo frio. Eu vejo através de olhos atordoados que a vida me passa com horas rápidas, vejo a juventude se despedindo de meu corpo. Me tiraram o calor da vida sem pedir permissão. Tiraram-me o que não se deve tirar de alguém que se ama. Se é que se ama.

Espero, espero, espero... espero pelo dragão de luz e ouro pousando sobre meus ombros, arrebatando com suas asas a água e a lama que me cobrem o peito. Com suas poderosas patas me levando através dos céus de bronze, num pôr do sol infinito. Sinto que ele ultrapassa as montanhas e agora sobrevoa comigo sobre um lago gelado. Sinto sob minhas mãos o espelho de vidro passar velozmente, sinto o frescor do ar que precede a chuva. Sinto que o sol sorri para mim, sorri timidamente entre as nuvens, encolhido no horizonte. Ele me promete te tirar da minha mente, promete-me que vai expulsar meus demônios e meus medos.

domingo, 17 de outubro de 2010

Para alguém que amo.


As vezes eu não resisto e faço desse blog mais pessoal. Sim, o blog é meu, teoricamente é pessoal, mas eu não quero que seja. Não quero que seja um diário, quero falar de coisas que tenham a ver comigo e meus sonhos, mas de outra forma, sem me envolver. Porém, as vezes a minha vida e minha falta de ideias pedem que eu abra um espaço para mim mesmo. ahahahaha

Bom, hoje eu vou falar um pouco de uma pessoa que amo. Na verdade eu amo poucas pessoas e dificilmente amo alguém. Mas acho que quando amo, admiro muito a pessoa e por ela vou até o inferno. Sim, é meio clichê falar isso, porém a verdade é essa. Algo tão difícil de acontecer, mas quando acontece, vem com uma intensidade tal que eu saio fora de mim.

A pessoa que eu amo e que vou falar hoje é alguém que eu fico admirando. Na verdade, essa pessoa não tem algo extraordinário e pra ser sincero, falta muita coisa nela ainda. Muita coisa! Não pense que por eu dizer que amo essa "tal pessoa" quer dizer que ela é uma pessoa admirável, muito pelo contrário. Mas eu amo mesmo assim.

A pessoa de quem vos falo, caro leitor, sou eu mesmo. Sim! Eu mesmo! Engraçado isso, não? Quantos nesse mundo amam a si próprio? Pois eu me amo! Amo o meu jeito de imaginar as coisas, o mundo, as pessoas. Amo viajar dentro de mim mesmo e quando descubro coisas novas sobre mim fico realmente empolgado.

Sabe o que mais amo e admiro em mim? A minha capacidade de passar horas me deliciando com alguma teoria, ideia, discurso, teorema... É o passatempo que eu mais me dedico. Eu tenho outras qualidades, mas não sou aquele cara que seja firme numa coisa só. Acho que sou feliz comigo mesmo, é claro que eu queria que coisas em mim mudassem, mas me amo do jeito que estou. Amo meu corpo, meu rosto, meus gostos e minhas vontades. Meus objetivos, apesar de serem incertos, estão se formando. Nem sei no que dará, mas quando eu me decidir com certeza, eu lutarei por eles até o fim.