quarta-feira, 26 de maio de 2010

Sempre ao seu lado


Eu estou nessa cama gelada de metal e não sei o que dizer. Eu sinto dor, mas isso não importa, você está aqui ao meu lado. Eu sinto também muito medo, mas eu confio em você, afinal, você está aqui do meu lado.

Por um momento eu fecho os olhos e me lembro de tudo aquilo que vivemos. Tudo o que vivi ao seu lado. Todas as brincadeiras, as noites de frio em que dormi com você debaixo da coberta, nos dias de chuva em que corremos na rua e das brigas que fugimos. Das noites em que dormi no celeiro, das nossas incursões pela floresta, do cheiro dos pinheiros, do vento tocando meu corpo. Da lua.

Você então se aproxima e toca meu pêlo delicadamente, vejo uma lágrima correr no seu olho. Não sei porque está chorando, embora eu esteja me sentindo mal e estranho, tudo vai ficar bem. Eu tenho certeza de que tudo vai ficar bem.

Surge na porta um homem de rosto sério, usando um paletó branco e alguns objetos na mão, você não o vê, esta de costas para ele, me acariciando, chorando sobre meu corpo. Ele pigarreia e você se vira. Então ele fala demoradamente, fitando-o direto nos olhos.

- Senhor, está na hora.

Eu sinto sua mão tremer sobre minha pele e então apertar meu pêlo, como se quisesse agarrá-lo. Você olha para mim mais uma vez, seus olhos estão cheios de lágrimas.

Fico confuso.

Você aproxima seu rosto bem perto do meu a ponto de tocar e então me abraça, me abraça forte, sem se importa com a dor que sinto nas juntas. Sinto seu corpo tremer violentamente, desesperado, não querendo me soltar.

Pela primeira vez sinto medo. Não medo do que vai acontecer, mas pelo modo como você está agindo.

- Adeus meu amigo- diz você- me desculpa.

Então você se cala. Ou melhor, algo em sua garganta te cala.

O home de jaleco branco se aproxima com uma agulha na mão, ele olha para mim com piedade no olhar. Toca meu corpo delicadamente e penetra agulha em mim. Passa um tempo, sinto a dor ir embora. As ideias e as lembranças vão me escapando como água, não posso segurá-las aqui perto de mim. Tento chamar você. Sinto medo. Não se afaste de mim. Tudo vai ficando escuro, não ouço mais nada, a visão vai escurecendo. Não tem mais dor, nem som, nem frio, nem nada.

Então tudo fica escuro, minha última lembrança foi seu rosto, seu toque, sua voz. Não tem mais medo, nem dor, nem sofrimento.

Agora onde estou, eu posso vigiá-lo. Você não me sente, não me vê, não me percebe. Mas eu estou aqui, seja no vento ou nas árvores.

Eu estou aqui...

Sempre que ouvir um latido na floresta ou em algum lugar e não souber de onde veio, serei eu, na minha mais expressiva presença, te chamando pra brincar.

Eu sempre estarei aqui...

3 comentários:

  1. eu ia ate escrever um palavrao aqui, mas iria acabar com essa postagem, cara ficou muuuito boa, voce que ta escrevendo ou ta copiando ?

    Gostei cara, divulga mais isso cara.


    Abracao

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  2. Ahahahahha eu que escrevo!
    Valeu Yann!!!
    Abraço

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  3. Quem já perdeu um amigo peludo não tem como conter as lágrimas. Lindo!

    Lívia

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