segunda-feira, 17 de maio de 2010

Sertanejo pobre


Ele abaixou a cabeça mais uma vez e chorou. Triste, sozinho e com fome.

Ele permanecia ali como uma estátua, tudo ao seu redor se alterava, se movia, evoluia. Menos ele.

O sol foi se pondo lentamente, sem esperar por ninguém. Veio então as luzes alaranjada dos postes e com elas vieram os arruaceiros, os drogados e as prostitutas. Ele permaneceu ali.

A terra prometida não fora como ele sonhara.

Ninguém disse isso a José quando ele ainda estava no seu agreste capinando a roça seca.

Por fome dos filhos, arrumou suas trouxas e pôs o pé na estrada. Sem saber o que iria encontrar, sozinho, com saudade, cheio de dor.

Chegou a cidade das oportunidades. Não haviam oportunidades. Nem dinheiro. Nem comida. Nem volta. Encontrou de consolação a sarjeta, ela, que não cobra taxa, nem juros, nem forma de pagamento alguma.

Deitou-se então no chão frio da calçada, sem coberta, sem comida, sem travesseiro. Pôs-se então a chorar. Chorou a saudade dos filhos, da mulher, do pai e da mãe. Chorou saudades da sua terra e pediu a Deus para voltar. Implorou com todas as suas forças que queria voltar a sua desolada terra e que de lá nunca mais iria sair.

Sentia frio. Fome. Saudade. Tristeza.





José não amanheceu vivo aquela manhã. Por fome, frio ou saudade. Foi enterrado como indigente.

Sua família nunca mais recebeu notícias suas. Passaram fome, frio, tristeza, saudades do pai.




Trecho do Auto da Compadecida (Nossa Senhora falando)


" João foi um pobre como nós, meu filho, e teve que suportar as maiores dificuldades numa terra seca e pobre como a nossa. Pelejou pela vida desde menino, passou sem sentir pela infância, acostumou-se a pouco pão e muito suor.

Na seca, comia macambeira, bebia o suco do xique-xique, passava fome.

E quando não podia mais rezava. E quando a reza não dava jeito, ia se juntar a um grupo de retirantes que ia tentar sobreviver no litoral.

Humilhado...

Derrotado...

Cheio de saudade...

E logo que tinha notícias da chuva, pegava o caminho de volta, animava-se de novo, como se a esperança fosse uma planta que crescesse na chuva. E quando revia sua terra dava graças a Deus por ser um sertanejo pobre, mas corajoso e cheio de fé."

Um comentário:

  1. parabéns pelo blog cara, difícil ver que ainda existem pessoas que possuem um sentimentalismo como o nosso em relação a nossa terra...

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